João Miguel Tavares jmtavares@dn.pt | |
E de repente, nós vivemos num mundo em que a televisão nos oferece: Os Sopranos, Sete Palmos de Terra, 24, Carnivàle, Donas de Casa Desesperadas, Anatomia de Grey, Perdidos, Deadwood, Dr. House, A Letra L, Irmãos de Armas, Anjos na América, Roma... e poderia continuar por aqui fora, a encher parágrafos. É absolutamente extraordinária a qualidade das séries televisivas que nos últimos anos têm surgido nos Estados Unidos. Já há quem lhe chame a nova época de ouro da televisão americana, remetendo para o imaginário dos anos 50, quando a TV substituiu a rádio, Alfred Hitchcock tinha lugar no prime time e praticamente tudo foi inventado do zero. Hoje parece existir um frenesim criativo idêntico - neste momento encontra-se mais talento por metro quadrado numa estação por cabo como a HBO do que em todos os estúdios de Hollywood. Qual é a melhor obra sobre mafia dos últimos anos? Os Sopranos. E o melhor western? Deadwood. E o melhor filme de acção? 24. A milhas de distância.
E nós por cá? Bom, por cá a grande luta de audiências do momento é entre uma rapariga pobrezinha que usa roupa colorida e fala com árvores e uma rapariga tristonha que se disfarça de freira para fugir à polícia. Nós, que somos tantas vezes alertados para o perigo imperialista da cultura americana, andamos a chafurdar em formatos de origem venezuelana, com a sofisticação própria do Terceiro Mundo. Ao pé disto, até um editorial do Avante! parece cheio de ideias progressistas. Mesmo essa bela ilha de risco e inventividade chamada Gato Fedorento teve de se converter, em nome do share, a um formato de mais fácil digestão, abdicando do seu humor sem peias para se colar à crítica da actualidade. Enquanto lá fora se multiplicam as séries obrigatórias, por cá enche-se o horário nobre com produção portuguesa de quinta categoria, enquanto o verdadeiro talento mirra por pura e simplesmente não ter espaço para se desenvolver. O problema não está na televisão, que oferece muito de bom - o problema, infelizmente, está em nós. Diz-me que programas vês e eu dir-te-ei quem és.
in http://dn.sapo.pt/2006/11/04/opiniao/tao_boas_series_ma_televisao.html
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